A importância da NR-01 na transformação cultural das organizações

O trabalho pode ser uma fonte de realização pessoal, construção de identidade e pertencimento — mas também pode ser um importante fator de sofrimento emocional. Em um cenário cada vez mais desafiador, marcado por metas agressivas, relações complexas e incertezas constantes, é essencial refletir: o ambiente de trabalho que oferecemos protege ou adoece as pessoas?

Essa pergunta ganha ainda mais força com a atualização da NR-01, que passa a exigir das empresas a gestão dos riscos psicossociais no ambiente laboral. E isso implica muito mais do que ações pontuais: exige uma verdadeira transformação cultural.


Quando o trabalho deixa de impulsionar e passa a adoecer

Segundo a CID-11, o Burnout é uma síndrome resultante do estresse crônico no trabalho que não foi gerenciado com sucesso. Seus principais sinais incluem:

  • Esgotamento emocional;

  • Distanciamento mental do trabalho, acompanhado de sentimentos de cinismo ou negativismo;

  • Redução da eficácia profissional.

O modelo de Maslach e Leiter nos ajuda a entender melhor os fatores que, quando em desequilíbrio, contribuem para o adoecimento:

  • Carga de trabalho: excesso de demandas sem os recursos necessários;

  • Recompensas e reconhecimento: ausência de validação — não apenas financeira, mas simbólica;

  • Autonomia: controle excessivo ou falta total de direção;

  • Relacionamentos: ambiente hostil ou com vínculos frágeis;

  • Propósito e valores: desalinhamento entre o que se faz e o que se acredita;

  • Justiça: percepção de decisões injustas ou tratamento desigual.


Riscos psicossociais: o que são e por que importam?

Riscos psicossociais são fatores relacionados à organização do trabalho, relações interpessoais, estrutura de poder e cultura organizacional que podem afetar significativamente a saúde mental e física dos trabalhadores.

Entre os principais estão:

  • Distribuição desigual ou excessiva de tarefas;

  • Prazos irreais e jornadas extensas;

  • Falta de reconhecimento e apoio;

  • Comunicação ineficaz;

  • Conflitos recorrentes, assédio e exclusão;

  • Ausência de autonomia e voz ativa.

Esses elementos não são apenas “problemas de clima”, mas questões estruturais que, quando ignoradas, alimentam ciclos de estresse e adoecimento.


A NR-01 e a gestão obrigatória dos riscos psicossociais

Desde agosto de 2024, a nova versão da Norma Regulamentadora nº 1 obriga as empresas a mapearem, monitorarem e gerenciarem os riscos psicossociais, com envolvimento ativo dos colaboradores.

Não basta oferecer ginástica laboral ou uma sala de descanso. É necessário mexer nas engrenagens da organização, com ações que envolvam escuta, planejamento, capacitação e mudanças estruturais.

A seguir, um caminho possível:

1. Identificação dos riscos

  • Realização de entrevistas diagnósticas e grupos focais;

  • Aplicação de pesquisas de clima e engajamento;

  • Análise de dados (absenteísmo, afastamentos, rotatividade).

Dica essencial: para que os dados sejam confiáveis, é necessário garantir sigilo, empatia e segurança psicológica.

2. Planejamento e intervenção

  • Priorização dos riscos mapeados;

  • Revisão de metas, fluxos de trabalho e formas de gestão;

  • Implementação de programas de apoio psicológico;

  • Capacitação de lideranças e equipes.

3. Monitoramento contínuo

  • Avaliação periódica das ações implementadas;

  • Novas rodadas de escuta;

  • Ajustes estratégicos com base nos resultados.

4. Promoção de uma cultura organizacional saudável

Para ir além da prevenção e realmente promover saúde mental, é preciso investir em:

  • Políticas claras e canais efetivos de escuta;

  • Ambiente de apoio e confiança;

  • Ações que promovam inclusão, pertencimento e diversidade;

  • Incentivo ao equilíbrio entre vida pessoal e profissional.


Confiança: o alicerce do cuidado em saúde mental

Nem todo sofrimento psíquico está relacionado ao trabalho — mas é inegável que o ambiente corporativo pode atuar como agravante ou atenuante. E a base de qualquer ação efetiva começa pela confiança.

Um local onde as pessoas sentem que podem pedir ajuda sem medo de julgamento é um local mais seguro, mais saudável e, consequentemente, mais produtivo.

Criar esse tipo de cultura exige intenção, formação e liderança sensível. Exige uma visão mais humana do trabalho e um compromisso real com o bem-estar das pessoas.


Conclusão

Atuar conforme a NR-01 é um passo importante — mas não deve ser visto apenas como uma obrigação legal. É uma oportunidade estratégica de evoluir como organização, fortalecer vínculos e gerar valor humano e sustentável.

Afinal, trabalho nunca é neutro. Ele pode ser lugar de dor ou de potência. O que sua organização está escolhendo ser?