"Prefiro sair": quando escolher a própria saúde mental é um ato de coragem.
Uma reflexão sobre saúde mental, riscos psicossociais e o que a Psicologia ensina sobre sair de ambientes que já não fazem sentido.
Recentemente, o movimento "prefiro sair" tomou as redes, acompanhado de histórias de pessoas que decidiram deixar seus empregos — não por falta de competência ou oportunidades, mas por excesso de carga, esgotamento emocional e falta de sentido.
Eu sei como é. Eu fiz isso.
Durante muito tempo, permaneci em um ambiente profissional que me oferecia um bom salário, um cargo estável e benefícios acima da média. Mas faltava algo essencial: reconhecimento, conexão humana, propósito.
Foi uma das decisões mais difíceis da minha trajetória profissional. E, ao mesmo tempo, uma das mais libertadoras.
Senti na pele o que é abrir mão da "segurança material" em nome da saúde mental. E mais do que isso: senti a força necessária para sair de um lugar que já não me cabia.
Por trás dessa escolha não houve impulso, nem irresponsabilidade. Houve reflexão, autoconhecimento e, acima de tudo, uma busca legítima por significado e conexões mais profundas.
A legislação trabalhista (NR-01) já reconhece os riscos psicossociais no trabalho. Mas nem sempre a cultura organizacional acompanha esse entendimento. Ambientes que não promovem pertencimento, que normalizam a sobrecarga, que silenciam o adoecimento de seus profissionais… também adoecem.
Na clínica, escuto histórias semelhantes. Pessoas que chegam dizendo: “não era só cansaço — era um cansaço que me tirava a vontade de viver.”
O trabalho tem um impacto direto na nossa saúde emocional — e não podemos mais ignorar isso.
É claro que sair nem sempre é uma opção viável para todos, em qualquer momento da vida. Uma decisão como essa exige reflexão, planejamento e, muitas vezes, tempo. Reconheço que tive o privilégio de contar com uma profissão que me permite diferentes caminhos e possibilidades de atuação — o que nem sempre é a realidade de todas as pessoas.
Na Psicologia, esse movimento pode se relacionar com diferentes aspectos:
- Autocuidado: sair de algo que incomoda ou causa danos é uma forma legítima de se proteger.
- Autonomia: reconhecer o direito de escolher o que te faz bem ou mal.
- Limites saudáveis: saber o momento de parar, mesmo quando é difícil.
- Evitação experiencial: em alguns casos, pode ser uma tentativa de fugir de emoções difíceis — e isso também merece atenção e suporte.
Sair nem sempre é desistir. Às vezes, é recomeçar. É permitir-se experimentar novas formas de de trabalhar - e viver!
O recomeço pode ser incerto, mas também pode ser fértil. Quando nos alinhamos aos nossos valores, criamos caminhos mais verdadeiros — mesmo que não sejam os mais "fáceis". Se você está vivendo algo parecido ou conhece alguém que esteja, saiba: você não está só. Falar sobre isso é um ato de coragem e um convite à transformação. Vamos juntos?