O que aconteceria se as lideranças nas organizações se relacionassem com suas equipes da mesma forma que um terapeuta rogeriano se relaciona com seu cliente?

Calma. Não estou sugerindo que o líder precise ser psicólogo formado — tampouco que atue como terapeuta da equipe. Mas vale a pena considerar o que Carl Rogers, psicólogo humanista, escreveu:

“Se eu posso criar uma relação caracterizada da minha parte: por uma autenticidade e transparência, em que eu sou meus sentimentos reais; por uma aceitação afetuosa e apreço pela outra pessoa como um indivíduo separado...”

Essa fala, extraída de seu livro Tornar-se Pessoa, pode parecer distante do mundo corporativo à primeira vista. Mas… e se for justamente o contrário?


1. Liderança como um encontro genuíno

Rogers propõe que relações transformadoras dependem de três condições fundamentais: autenticidade, aceitação incondicional e empatia.

No contexto organizacional, essas atitudes podem soar ingênuas ou idealistas. No entanto, pesquisas em liderança e cultura — como as de Amy Edmondson e Brené Brown — mostram que ambientes psicologicamente seguros são mais inovadores, saudáveis e produtivos.

E se a cultura da sua empresa dependesse menos de processos e mais da qualidade dos encontros humanos que ocorrem todos os dias?

Aliás, muitas vezes, quando há entraves nos processos, a origem está na qualidade das relações. Mas isso é assunto para outro artigo que publiquei no meu perfil.*


2. Impacto na cultura e no desenvolvimento humano

Quando líderes se permitem ser autênticos e criam um ambiente de escuta e aceitação, como sugere Rogers, os colaboradores:

  • sentem-se mais livres para se expressar e propor ideias;
  • tornam-se mais resilientes e autoconfiantes;
  • desenvolvem-se como pessoas mais íntegras, alinhadas com seus valores;
  • contribuem para um ambiente onde as diferenças são respeitadas — e não silenciadas.

Isso não é apenas “soft skills” — é fundamento para equipes adaptativas, criativas e responsáveis. Exatamente o que as empresas buscam em contextos de mudança constante.


3. A liderança que inspira transformação

A fala de Rogers continua:

“...Então o outro indivíduo na relação: experienciará e compreenderá aspectos de si mesmo que havia anteriormente reprimido; tornar-se-á mais semelhante à pessoa que gostaria de ser; será mais autodiretivo e autoconfiante...”

Líderes que se relacionam com essa postura criam espaço para que suas equipes cresçam não apenas profissionalmente, mas como seres humanos. E essa transformação reverbera na cultura, nas entregas e no clima organizacional.


4. O desafio: abrir mão do controle

A proposta rogeriana é desafiadora porque parte do pressuposto de que não controlamos o outro.

Liderar nesse modelo é sustentar o espaço para que o outro floresça — e não moldá-lo à força.

É sobre confiar que, quando a base da relação é segura, as pessoas se tornam sua melhor versão.


Conclusão: cultura é o reflexo das relações.

Se cultura organizacional é aquilo que se vive no dia a dia — mais do que o que se escreve nas paredes —, então cultivar relações autênticas e respeitosas é cultivar cultura.

E talvez Carl Rogers, sem nunca ter ocupado um cargo de gestão em empresas, tenha nos deixado uma das mais potentes definições de liderança:

“Parece-me que temos aqui uma hipótese geral que oferece possibilidades empolgantes para o desenvolvimento de pessoas criativas, adaptativas e autônomas.”

E você?

Você já trabalhou com alguém que liderava a partir da escuta, da empatia e da autenticidade? Como foi essa experiência?